Publicidade médica: 15 reflexões necessárias

Depois de mais de uma década, exatos 12 anos, o Conselho Federal de Medicina (CFM), publicou, enfim, a nova resolução de publicidade médica. A Resolução CFM nº 2.336/2023 será a nova definidora das regras de publicidade e de propaganda médica. A partir de 11 de março de 2024, a  2.336/2023 revogará três outras resoluções que norteiam o tema hoje: a Resolução CFM nº 1.974/2011 , a Resolução CFM nº 2.116/2015 e a Resolução CFM nº 2.133/2015.

Para mergulharmos no tema e sairmos do mero “pode”, “não pode”, que  não nos faz avançar no debate, nem na relação médico-paciente, vamos fazer algumas reflexões sobre as consequências  da publicação da nova norma na relação médico-paciente. Por que a norma vai precisar de 180 dias para entrar em vigor? Que providências precisam ser tomadas para que os médicos se adequem às novas orientações deontológicas? Quais as implicações éticas desta resolução na vida dos pacientes? Estamos diante de um avanço ou de um retrocesso?

Mercado aviltado?

A nova resolução permitirá a divulgação do tão desejado “antes e depois”. Isso é bom? Será mesmo? Vamos abordar vários pontos sob essa questão neste artigo. Há muito tempo a discussão sobre a liberação “do antes e do depois” agita o mundo médico. Vimos até mesmo decisões liminares em primeira instância, na Justiça, que induziam o médico a erro, fazendo-o supor que era possível a publicação de fotos que mostrassem o resultado de procedimentos médicos.

Os defensores da prática alegam que profissionais que não são médicos têm uma liberdade maior de divulgar o seu trabalho e angariar clientela porque não há uma limitação ou regulamentação nesse sentido para eles. E que isso se constitui numa vantagem comercial que favorece esses profissionais. Será?

Tal fato não se comprova na vida real. Segundo a Demografia Médica no Brasil 2023, pesquisa do próprio CFM, no conjunto de 31,6 milhões de declarações de IR em 2020, a renda média mensal declarada pelos brasileiros foi de R$ 8.964,00  enquanto a dos médicos foi de R$ 30.196,00, valor 3,4 vezes maior. Já em comparação com outras categorias profissionais selecionadas, entre declarantes do IRPF em 2020, os médicos têm rendimento médio três vezes maior que dentistas, e entre quatro e cinco vezes maior que outras profissões da saúde.

demografia médica 2023

Uso da imagem do paciente

O uso da imagem do paciente, conforme o exposto no Capítulo IX, da nova norma, vai de encontro ao Código de Ética Médica (CEM), mais especificamente ao artigo 75, que diz que é vedado ao médico:

“Fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou imagens que os tornem reconhecíveis em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente”.

Como não se faz menção no texto da nova resolução que esse artigo do CEM será revogado, não é possível empregar as imagens de pacientes na publicidade médica, correto?

O emprego do recurso “antes e depois” e do uso da imagem do paciente na publicidade requer também que o médico obtenha do mesmo a autorização  para o uso da imagem e ofereça ao paciente  a garantia de anonimato e de respeito ao pudor e à sua privacidade,  diz a nova resolução.

Fora do papel, como fazer tudo isso seguindo as normas deontológicas?

Código de Ética Médica

LGPD

Além do Código de Ética Médica proibir tal  conduta – expor o paciente – entramos na seara do “obter consentimento para tratamento de dado pessoal”, ou seja, estamos entrando no campo da Lei Geral de Proteção de Dados, LGPD,  e do sigilo e do prontuário médico.

A LGPD nos diz, desde 2018, que todo dado de saúde relativo ao paciente é um dado sensível. E esses dados sensíveis, além de terem um tratamento diferenciado pela LGPD, também integram o prontuário médico.

No entanto, obter o consentimento do paciente para o uso da sua imagem em peças publicitárias é essencial segundo a nova resolução. Mas vamos refletir um pouco sobre esse termo…  Consentimento é  um dos conceitos que embasa a LGPD. É a manifestação livre e informada, pelo qual o titular de dados (o paciente) concorda com o tratamento de seus dados pessoais para uma finalidade determinada (publicidade médica).

Quem opera com dados sensíveis tem que saber que o titular dos dados pessoais (o paciente) tem o direito  de consentir o tratamento de seus dados, mas também tem o direito de solicitar a revogação do consentimento dado ao controlador dos dados pessoais (médico) e o direito de pedir informações acerca do compartilhamento de seus dados pessoais e, em algumas situações, o direito de solicitar a exclusão de seus dados. Como fazer isso após a divulgação da imagem do paciente?

Tenho acompanhado a implementação da LGPD em consultórios e clínicas de pequeno e médico porte em todo o Brasil. Percebo a  baixa maturidade dos controladores de dados (médicos) no que se refere à proteção da privacidade e dos dados pessoais. Os médicos caminharam pouco no sentido de se adequarem à lei. Não imagino que até março de 2024, o cenário de adequação à LGPD esteja mais maduro. Os órgãos reguladores publicaram resoluções e até mesmo uma cartilha orientadora sobre o tema, mas com um conteúdo muito superficial, que pouco auxilia o médico na vida prática.

Cartilha LGPD

Vulnerabilidade do paciente

Temos que ser honestos e reconhecer que a relação médico-paciente não é simétrica, existe uma vulnerabilidade por parte do paciente.

Qual o paciente diria não ao seu médico especialmente, no caso de doenças graves, antes de procedimentos cirúrgicos ou mesmo no pós-parto, caso ele lhe pedisse autorização para divulgação da sua imagem? A própria relação de cuidado inibe o paciente a dizer não ao médico.  O consentimento é fornecido, mesmo a contragosto, em muitos casos.

Mas precisamos ir além da relação médico-paciente no consultório em circunstâncias normais… Precisamos pensar no uso da imagem de forma ampla, compreendendo todos os tipos de pacientes. E quando o paciente não tem como conceder o seu consentimento, pois é ou está incapaz, a sua família pode fazê-lo? E quando o paciente é um indigente e está inconsciente num bloco cirúrgico? E quando o médico vai postar uma foto com uma celebridade, que também é seu paciente e seu amigo, apenas na sua rede social da vida privada, isso é quebra de sigilo médico?

Sigilo médico, prontuário médico

Especificamente em relação ao “antes e depois”, outro ponto importante está relacionado ao sigilo do prontuário médico. O “antes e depois” de uma cirurgia está registrado no prontuário do paciente, certo? É possível renunciar ao sigilo em função da publicidade médica?

É a própria Constituição que celebra o direito fundamental à intimidade e à vida privada, em seu art. 5º:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O prontuário médico é um documento – decorrente da Carta Magna – relativo aos direitos individuais do paciente, que fica sob a guarda do médico e que não pode ficar ao dispor de terceiros, salvo as exceções previstas no exposto Art. 89 do CEM. Neste sentido, a Resolução CFM nº 1.638/2022 confere caráter sigiloso do documento.

Como fazer a divulgação de fotos “antes e depois” se essas imagens integram o prontuário médico?

Se resolvidos os problemas deontológicos de acima listados, o emprego do “antes e depois” está condicionado a uma série de normas. Essas peças publicitárias devem ser acompanhadas por imagens com indicações, resultados satisfatórios, insatisfatórios e potenciais complicações decorrentes da intervenção.

As fotos não podem passar por edição, pois serão consideradas estelionato. O médico também deve apresentar perspectivas de tratamento para diferentes biotipos e faixas etárias, abrangendo a evolução imediata, a médio prazo e a longo prazo. Ou seja, teremos idosos, pardos, negros, orientais e pessoas com deficiências presentes nessas postagens… Ou pelo menos esperamos que sim.

“Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto. Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça”.

Juramento de Hipócrates

Propaganda enganosa, consumidor empoderado

Essa sensação de “mais liberdade para fazer publicidade” acarreta mais responsabilidade para o médico. Há muito tempo o paciente se vê como um consumidor poderoso. O “antes e depois” reforça isso, pois cria no paciente a expectativa de que ele irá obter um resultado específico e, sendo ele considerado um consumidor, à luz do  Código de Defesa do Consumidor (CDC), e aos olhos da justiça comum, segundo o Código Civil (CC), um detentor de direitos quanto à “promessa” que lhe é feita.

O CDC ampara o paciente na condição de consumidor de serviços médicos, garantindo-lhe o direito à informação adequada e clara, à qualidade e segurança dos serviços, à prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais, à inversão do ônus da prova e à efetiva proteção e repressão de práticas que possam ser consideradas abusivas.

O CC regula os requisitos da capacidade jurídica, do consentimento informado, da boa-fé, da autonomia da vontade e da função social do contrato. Ele estabelece os requisitos para a validade dos contratos de prestação de serviços entre médicos e pacientes, determinando que o médico deve informar ao paciente, de forma clara e precisa, as condições do tratamento, os riscos, as alternativas e os resultados esperados, evitando promessas infundadas ou garantias de sucesso. A publicidade médica deve ser cercada de todos esses cuidados, pois é ela que baliza o contrato de prestação de serviços.

Código de Defesa do Consumidor

A valorização do médico especialista

Segundo a Demografia Médica no Brasil 2023, o Brasil conta hoje com 564 mil médicos, sendo 270 mil generalistas e 294 mil especialistas. O termo “generalista” designa todo médico não especialista, ou seja, aquele que concluiu os seis anos da graduação, mas não cursou Residência Médica nem obteve título em sociedade médica.

A nova norma centra-se na figura do médico especialista, garantindo-lhe segurança, desde que ele torne pública a sua qualificação, seguindo as recomendações da nova resolução. Embora o próprio estudo do CFM aponte que o crescimento do número de vagas de graduação da última década, sem proporcional aumento no número de vagas de Residência Médica, fará com que a proporção de médicos generalistas (sem título em especializadas) cresça nos próximos anos.

Assim sendo, há apenas uma mudança  na apresentação das peças publicitárias físicas e virtuais em relação à resolução anterior, a inclusão da palavra MÉDICO, como item obrigatório. Assim, a nova assinatura obrigatória ficará assim:

JOÃO MENDES

CRM-SP  1234

MÉDICO

CARDIOLOGISTA

RQE 4321

O médico especialista também pode anunciar outros títulos, como pós-graduação latu sensu ou stricto sensu,  em até duas áreas relacionadas às suas especialidades ou áreas de atuação.

Para o generalista que desejar publicizar  pós-graduação latu sensu ou stricto sensu, é preciso primeiro registrar o título no CRM de origem. Esses títulos não receberão um número do órgão regulador, apenas uma declaração que foram registrados. Após os registros, eles poderão ser expostos ao público da seguinte maneira:

JOÃO MENDES

CRM-SP  1234

MÉDICO COM PÓS-GRADUAÇÃO EM DERMATOLOGIA

NÃO ESPECIALISTA

O “não especialista”, que é como a resolução passa a designar o médico generalista, também não pode anunciar que trata de sistemas orgânicos, órgãos ou doenças específicas, por induzir à confusão com a divulgação de especialidades. Esta exigência se relaciona diretamente com a  propaganda enganosa e o Código de Defesa Do Consumidor.

Selfies e reposts

A nova resolução reconhece a importância do marketing digital para a publicidade médica – chega até a mencionar algumas plataformas –  mas seus autores demonstram pouco conhecimento sobre o funcionamento das redes sociais. O que vai ocasionar novos problemas para a implementação da nova norma…

Selfies do próprio médico  serão permitidas nas redes sociais, bem como o reposts de selfies de pacientes. Mas no momento em que  o médico reposta o paciente, ele quebra o sigilo médico, surge o problema do uso da imagem sem autorização. E aqui o médico não tem “dolo” ao agir, porque ele não pode interferir nesse mecanismo automatizado da rede social.

Quando o médico utilizar sua rede social para divulgar ao mesmo tempo  seu trabalho e sua vida privada, deve observar todas as normas listadas até agora. Se a redes forem empregadas apenas para a vida privada, não.

Outro ponto da resolução também destaca que é possível utilizar fotografia ou vídeo com detalhes de seu ambiente de trabalho, sua própria imagem, de membros da equipe clínica e de outros auxiliares. Importante que o médico solicite que todos os membros da equipe assinem um termo de cessão de imagem gratuita, antes de fazer a foto ou gravar o vídeo. Membros da equipe clínica e auxiliares são detentores dos mesmos direitos de privacidade que o paciente.

Valor não é preço

Outro ponto muito festejado: a resolução autoriza  informar valores de consultas e de procedimentos particulares, meios e formas de pagamento, que poderão  ser acordados entre as partes previamente ao atendimento e sua execução. Também é possível anunciar abatimentos e descontos e fazer campanhas promocionais. Mas continuam proibidos promoções, vendas casadas e premiações.

Já é possível anunciar preços, com as normas vigentes…, mas cuidado com o entusiasmo vazio. Preço hoje não é apenas preço… Como o médico se diferencia da sua concorrência hoje?  É pelo preço? Lembre-se que sempre há outro profissional que consegue cobrar mais barato.

É fundamental entender que os preços de venda estão associados ao posicionamento mercadológico. Quando o paciente entende o valor do serviço, quando ele tem informações suficientes para entender esse processo, ele não questiona preço e nem diminui o valor do negócio.

Valor só é percebido com construção de marca, personal branding. E qual é o médico que  precisa investir em personal branding? É aquele que tem dificuldade de se diferenciar. Tem conhecimento, experiência e relevância,  mas  a sua imagem não é condizente com o valor que possui. É aquele que atua numa especialidade onde a concorrência com profissionais mais experientes ofusca novos talentos. É o profissional que deseja maximizar o seu valor de venda, ou seja,  ele deseja atuar onde não há “guerra de preços”.

A nova resolução de publicidade médica exige que o médico tenha agora ao seu lado um excelente estrategista de marca, além de um  consultor jurídico impecável.

Tecnologia não é diferencial

A nova resolução de publicidade médica permite também anunciar os aparelhos e os recursos tecnológicos, desde que o médico não atribua capacidade privilegiada a aparelhagens ou divulgue  equipamento e/ou medicamento sem registro na Anvisa.

Como um médico pode se diferenciar da concorrência hoje? Já vimos que não é pelo preço. É pela tecnologia? Tecnologia não é diferencial na maioria dos casos…  Qualquer médico pode ter acesso aos mesmos aparelhos e técnicas que o seu concorrente de bairro, cidade, estado… Não adianta absolutamente nada informar que o laser tal chegou na clínica.

Para trazer essa resolução para o mundo real, o estrategista de marketing é tão importante quanto o advogado agora…

E entender sobre diferenciação pode salvar a carreira do médico. Portanto, vamos lá!

Quando o profissional tem poucos ou não tem concorrentes, ele investe em vendas. À medida em que os concorrentes vão aumentando é preciso se diferenciar. Aí, ele  investe em marketing. Mas, quando todas as barreiras tecnológicas caem, todos os concorrentes têm acesso à mesma tecnologia, o modelo de gestão empregado em mercados comoditizados e com excesso de ofertas e opções, como o mercado médico, é o personal branding.

Cursos e treinamentos

Os cursos on-line médicos tornaram-se populares durante  a pandemia. Muitos médicos que nem pensavam em ministrar aulas encontraram na educação uma outra possibilidade de renda. O CFM já havia emitido o Parecer n° 11/2020 sobre as normas de publicidade médica para essa modalidade educacional.

Agora, a resolução de publicidade médica traz as orientações sobre a divulgação para todas as modalidades de cursos. Médicos podem oferecer cursos para leigos e outros profissionais de saúde, desde que não ensinem atos privativos médicos. Também podem ofertar cursos específicos só para médicos sobre atos médios privativos, observando todas as normas de publicidade médica e de sigilo médico.

Relacionamento com a imprensa

Não houve mudança em relação à resolução vigente. O médico pode conceder entrevistas para rádio, podcasts, televisão, jornais, revistas. Durante as entrevistas, continuam proibidos a divulgação de telefone, endereço e de se apresentar como especialista, quando não cumprir os requisitos exigidos pelo órgão regulador. O tom das informações repassadas ao público deve ser eminentemente educativo. Devem ser evitados  o sensacionalismo, a autopromoção e a concorrência desleal, termos definidos na resolução.

E nunca é demais reforçar que o que não é medicina baseada em evidências não deve ser divulgado nem em entrevistas, nem nas mídias digitais: cloroquina para tratar a Covid-19, campanhas antivacinas, curas milagrosas, resultados únicos, “métodos próprios de tratamento” (meu método de emagrecimento, meu protocolo antiaging), ozonioterapia, hemoterapia ozonizada, soro da imunidade, dieta desintoxicante, terapias hormonais com o objetivo de retardar, modular ou prevenir o processo de envelhecimento, dentre muitos outros.

Aqui, também é preciso estar atento às recomendações  sobre  não participar de propaganda/publicidade de medicamento, insumo médico, equipamento, alimento;  não conferir selo de qualidade, ou qualquer outra chancela, a produtos alimentícios, de higiene pessoal ou de ambientes, material esportivo;  não entrar em listas de premiações, homenagens, concursos ou similares com a finalidade de escolher ou indicar profissional para o recebimento de títulos como “médico do ano”, “destaque da especialidade”, “melhor médico”.

Cirurgias seguras

 

A resolução proíbe entradas ao vivo, o que chamamos de lives, durante a realização de procedimentos  e cirurgias, exceto em trabalhos e eventos científicos, voltados apenas para médicos ou na captura de imagens de partos, quando a parturiente e/ou familiares assim desejarem e houver anuência do médico, único momento que uma equipe externa de filmagem pode estar presente.

A pergunta de cunho pessoal que precisa ser feita  é uma equipe de filmagem deve estar presente num parto?

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 254 milhões de cirurgias são realizadas por ano no mundo, uma média de uma cirurgia a cada 25 pessoas. O alto número  traz um dado preocupante: cerca de sete milhões de pessoas têm algum tipo de complicação pós-cirúrgica e cerca de um milhão morre durante ou após a cirurgia.

A OMS afirma que pelo menos metade das complicações e mortes poderia ser evitada se medidas básicas de segurança fossem seguidas. Com o objetivo de propor soluções para o problema, a OMS criou, a Aliança Mundial para Segurança do Paciente e lançou a campanha Cirurgia Segura Salva Vidas.

Atento ao problema, o Colégio Brasileiro de Cirurgiões (CBC) aderiu à iniciativa e lançou, em 2014, o seu Programa de Cirurgia Segura, com a criação de um Manual de Cirurgia Segura, e um checklist cirúrgico com o objetivo de contribuir para a plena percepção do risco, primeiro passo para a mudança, ou reforço, visando uma prática cirúrgica segura e efetiva.

As pessoas agem  de maneira diferente quando sabem que estão sendo fotografadas ou filmadas. Sou estrategista de marcas, dirijo ensaios fotográficos e vídeos médicos. E tudo o que sabemos sobre segurança no bloco cirúrgico me leva a crer que nenhuma cirurgia deve ser fotografada ou filmada com fins publicitários. Esse tipo de registro não está presente em nenhum checklist de segurança do paciente.

Manual-Cirurgia-Segura

Estatuto dos Direitos do Paciente

Tramita no Congresso Nacional a proposta (PL 5.559/2016), que já foi aprovada pela Câmara dos Deputados e agora está sendo analisada pelos senadores. Trata-se do Estatuto dos Direitos do Paciente, que tem o objetivo de garantir a assistência ao cidadão nos serviços de saúde públicos e privados.

O projeto de lei aborda a autonomia do paciente, a qualidade e a segurança dos serviços de saúde, o direito à informação e a confidencialidade no atendimento prestado ao paciente. O projeto de lei conversa bem com a nova resolução. Esse é um momento oportuno de conversar com  deputados e senadores para ampliar a discussão sobre privacidade do paciente.

Fiscalização

A resolução determina que a Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (Codame)  de cada estado seja por composta, por, no mínimo, três membros e tenha atribuições educativas e  punitivas.

A ela cabe a promoção de campanhas educativas para os médicos para apoiá-los na implementação dessas medidas, dentre elas um novo  Manual da Codame.

E além de rastrear as divulgações nas mídias físicas e digitais para adotar as medidas cabíveis, pela primeira vez, ela receberá denúncias com material publicitário, de forma anônima, para apuração. Será necessário criar um canal próprio para isso.

Quanto maior a liberdade de ação, maior será a fiscalização. Os processos internos  não devem tramitar mais de 60 dias no CRM. É o que a norma prevê.

E por fim…

A publicidade médica não é proibida ou ilícita. O problema é que o que está sendo proposto não  tem volta. Privacidade do paciente quebrada “não tem conserto”, não há como reparar o dano ou voltar atrás…

O artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), estabelece que o direito à vida privada é um direito humano:

“Ninguém será objeto de ingerências arbitrárias em sua vida privada, sua família, seu domicílio ou sua correspondência, nem de ataques à sua honra ou à sua reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou ataques”.

É preciso discutir além do conteúdo da publicidade médica, o tipo de publicação que se pretende autorizar. O uso da imagem do paciente tem implicações éticas e bioéticas que precisam ser discutidas com a sociedade.

E além de deputados e senadores, que estão se debruçando sobre o Estatuto Dos Direitos do Paciente, penso que seria produtiva uma avaliação do conteúdo da nova resolução por mais players, como o Ministério da Saúde, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, (ANPD), o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), o Instituto Brasileiro de Defesa do Paciente (IBDPAC), o Ministério Dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDH), o Conselho Federal da OAB, o Instituto Brasileiro de Comunicação em Saúde (IBCS), a Patient Centricity (primeira escola de Experiência do Paciente do Brasil), isso sem contar com as associações de pacientes e comissões especializadas de assembleias legislativas e câmaras municipais. Ampliar esse debate é necessário.

 

Márcia Wirth

Estrategista de Marcas Médicas
Personal Branding, Marketing Médico e Experiência do Paciente

(Artigo original produzido para este site. Pode ser reproduzido com os devidos créditos).

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